Sir Elton John definitivamente não é uma personalidade fácil de se resumir, ou classificar. Sua vida, desde a infância, foi uma coleção de drásticos altos e baixos, culminando em uma espécie de contos de fadas moderno. Mas o caminho percorrido até lá, a história real de inseguranças, medos, abandono, vícios, abusos e glórias que antecedem toda a fantasia, é mais interessante, envolvente e possui um final mais satisfatório do que o destino de qualquer príncipe – ou princesa. A nova biografia dirigida por Dexter Fletcher recebeu aplausos de pé no Festival de Cannes, reação muito fácil de entender uma vez que se tem a oportunidade de assisti-la.
Rocketman, que devido à natureza do seu personagem principal também trata-se de um musical, é tudo que se pode pedir de um filme do gênero: conta a história de forma emocionante, detalhada e verdadeira, sem fugir dos momentos menos glamourosos, e ao mesmo tempo, sem transformar o artista em mártir ou vítima, mas em sobrevivente e mais tarde, em vencedor. Devido à uma infância difícil protagonizada por um pai ausente e incapaz de demonstrar qualquer afeto e uma mãe mais preocupada com ela mesma do que com o filho, Elton – nascido Reginald Dwight e interpretado por Taron Egerton – precisou enfrentar as consequências de ser um adulto ansioso e de baixa autoestima. Como forma expressão, Elton desde cedo pôde contar com piano, instrumento que aprendeu a tocar sozinho acompanhando músicas de ouvido. Durante a juventude, depois de tocar em diversas bandas, decidiu partir em carreira solo, como músico, cantor e compositor. As letras, entretanto, não eram tanto o seu forte. Foi assim que conheceu o letrista Bernie Taupin (Jamie Bell), que viria a se tornar seu amigo inseparável por mais de 50 anos.
A dupla permaneceu unida desde o primeiro grande sucesso, e as colaborações de Bernie são inegáveis, porém são nos momentos mais extremos – sejam tristes ou alegres – onde Jamie consegue transmitir toda a delicadeza e sinceridade abundantes de Taupin, fazendo um contraponto gritante com os demais personagens do universo de Elton. Com a fama e o dinheiro, vieram também as festas, drogas e os amores – ou assim ele pensava. O diretor seguiu as recomendações do próprio Elton, que, como co-produtor, não abriu mão que todos os aspectos de sua vida fossem mostrados sem pudores, incluindo a cena na qual perde a virgindade com o ex-empresário e amante John Reid, interpretado por Richard Madden (Game of Thrones). O relacionamento dos dois rapidamente torna-se tóxico, e Elton passa a sofrer abusos tanto físicos quanto morais.
“Bohemian Rhapsody”, que conta a história da banda Queen, tem muito o que aprender com o longa de Fletcher. O filme foi bastante criticado pela comunidade lgbtq por ter tentado diminuir, ou colocar em segundo plano, a homossexualidade do vocalista Freddie Mercury. Rocketman, ao contrário, não se acanha perante as expressões mais extravagantes e exuberantes da pessoa de Elton, seja nos figurinos e números musicais, ou pela atuação certeira de Egerton. É nítida a paixão e o comprometimento que o ator trouxe na hora de filmar o longa: sua ótima atuação e bela voz são gratas surpresas que ajudam a alavancar ainda mais um filme que já se encontra nas alturas.
Com respeito, carinho e dignidade, o longa presta uma belíssima homenagem à um dos maiores artistas da música, e pode facilmente levar Taron Egerton à nomeação de Melhor Ator, além de competir por diversos outros prêmios. Rocketman estreia nos cinemas no dia 30 de maio.